O drama das mulheres raptadas e forçadas a se casar: ‘Ele me estuprava todos os dias’

Rubie Marie, 35, nasceu e cresceu no País de
Gales. Teve uma infância feliz, mas tudo mudou quando ela fez 15 anos e foi
obrigada a se casar. No Reino Unido, discute-se se criminalizar a prática é o
melhor caminho
.

Rubie Marie era estuprada diariamente pelo marido para engravidar. — Foto: BBC
Rubie Marie era estuprada diariamente pelo marido para engravidar. — Foto: BBC
Rubie Marie, 35,
nasceu e cresceu no País de Gales. Teve uma infância feliz, mas tudo mudou
quando ela fez 15 anos.
Marie foi levada
para Bangladesh como se a família estivesse saindo de férias. “Era para
ficarmos por seis semanas, mas aí aumentou para dois meses, depois três, depois
seis”, diz ela.
“Eu dizia
para o meu pai que queria voltar para casa, para a escola, para os meus amigos.
Mas ele respondia coisas como ‘a gente gastou dinheiro demais vindo para cá’.
Essa era a desculpa dele, a forma de esconder que estava planejando meu
casamento.”
“Lembro
como se fosse hoje. Eu estava sentada jantando com a família e ele apareceu,
sentou-se e começou a comer. De repente, disse: ‘Não seria ótimo se a gente
casasse a Rubie?’ Eu morri de vergonha. Eu era criança, dei um ataque, joguei
meu prato no chão, saí batendo porta, fui correndo para o quarto, aos berros.
Não conseguia lidar com aquela informação”, conta ela.
“Me
colocaram num sistema de leilão. Um dos meus tios começou a me leiloar. Foi
horrível, fui tratada como uma escrava. Eu estava num lugar totalmente estranho.
Não sabia para onde ir, não sabia nem onde tinha telefone, nada.”
‘Fui desonrada’
Marie foi
obrigada a se casar com um homem que tinha o dobro da sua idade. Na festa de
noivado, foi vestida “como uma boneca”.
“A casa
estava cheia de gente rindo, tinha um bando de gente tentando entrar no meu
quarto para me ver, para dar uma espiada na noiva. E eu só fiquei sentada lá
pensando: ‘sou um objeto’. Pensava: ‘volte para casa, faça o que tiver de fazer
para voltar para casa’.”
Depois do
casamento, seu marido quis um filho.
“Eu era estuprada praticamente todos
os dias para engravidar, porque assim ele poderia ir morar no Reino Unido, por
causa do filho. Esse era o plano deles”, conta
.
Ela finalmente
engravidou e voltou para o País de Gales para ter o bebê. Quando ele nasceu,
ela fugiu. “Isso envergonhou minha família. Eu fui desonrada por muito
tempo.”
Ela hoje vive na
Inglaterra e trabalha como ativista, educando as pessoas sobre casamento
forçado.
“Agora eu passo a mensagem de que há
luz no fim do túnel, há um lugar para você no mundo. Não é tudo horrível. Não é
o inferno. Você tem que dar a volta por cima, senão ninguém vai fazer isso por
você.”

Criminalizar é a solução?

Tornar o
casamento forçado um crime pode fazer as vítimas não denunciarem, dizem
ativistas.
O fato de ser
proibido por lei “manda um recado”, mas, por outro lado, afasta
algumas pessoas, diz uma ONG.
O casamento
forçado é crime no Reino Unido desde 2014. No País de Gales, só houve uma
denúncia formal, mas o governo acredita que haja cerca de 100 desses casamentos
por ano.
Shahien Taj, de
uma ONG que atua com famílias muçulmanas, disse à BBC que é necessário um
trabalho de prevenção para educar quem comete esse tipo de crime, que em geral
são os pais das vítimas.
Ela diz que
normalmente a vítima quer voltar para a casa dos pais quando a situação se
resolve.
“Nunca conheci uma vítima que dissesse
que não se importava que a polícia fosse atrás dos seus pais. Na maioria das
vezes, eles não querem nenhum tipo de intervenção por esse motivo”, disse
Taj
.

Samsunear Ali,
de outra ONG, a Bawso, diz que a educação é essencial, pois muitos pais sequer
sabem que estão cometendo um crime.
“Na visão deles, estão fazendo a coisa
certa. É um problema gravíssimo e que tem sido pouco discutido.”

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