Pesquisadores divulgam documento contra a liberação do uso de cloroquina sem comprovação científica

Cloroquina Foto: Reuters

Nota
alerta que estudos demonstram que o uso do medicamento pode estar associado a
aumento da frequência de eventos adversos graves e maior letalidade

 

RIO —
Um grupo de médicos e cientistas divulgou, nesta quarta-feira, uma nota sobre o
novo protocolo da cloroquina /hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19.
O documento tem como base 71 estudos ou artigos publicados pelos mais renomados
institutos e cientistas do mundo. A nota frisa que não há evidências
científicas favoráveis que sustentem o uso do medicamento, que teve a sua
utilização liberada por um protocolo do Ministério da Saúde autorizando o uso
para todos os estágios da doença.

 

O
documento alerta que há estudos que demonstram que o uso de cloroquina para o
tratamento de Covid-19 pode estar associado à maior frequência de eventos
adversos graves e com maior letalidade. Para os pesquisadores, o uso do
medicamento deve ser restrito a protocolos de pesquisa aprovados por comitês de
ética em pesquisa. Outra conclusão é a de que a prescrição de um tratamento sem
comprovação científica de eficácia, mas com demonstração de risco de efeitos
colaterais graves, poderá fazer com que o prescritor incorra em dano a preceitos
legais ou éticos.


— A
liberação deste documento científico coincide com o chamado protocolo do MS.
Ele é fruto da reflexão conjunta de um grupo de médicos e pesquisadores, com o
objetivo de oferecer uma revisão dos estudos até agora desenvolvidos, à luz dos
critérios mais rigorosos metodologicamente e, em especial, à cronologia
histórica do uso desses fármacos HCQ e CLQ. Com o recuo dos quase cinco meses
de conhecimento da doença, não é mais defensável sob quaisquer circunstâncias a
recomendação desses fármacos para uso clínico, a não ser em estudos
prospectivos — disse a pneumologista Margareth Dalcomo, pesquisadora da Escola
Nacional de Saúde Pública (ENSP), da Fiocruz.

Logo
na introdução, a nota informa que “uma das razões para o impressionante impacto
da pandemia da Covid-19 na saúde mundial é a inexistência, até o presente
momento, de vacinas ou antivirais específicos aprovados para prevenir ou tratar
a enfermidade, cuja letalidade real ainda nos é incerta, pois depende
grandemente da disponibilidade de testagem ampla e da qualidade do serviço de
saúde.”

A nota
explica a conclusão de vários estudos sobre o uso da cloroquina em pacientes
com Covid-19 em vários estágios da doença e conclui:

 

“A
discussão em torno do uso, no Brasil, de um fármaco não recomendado para
Covid-19 por todas as sociedades científicas internacionais nos tem levado a
vivenciar o epicentro da doença, em escala mundial, impossibilitando a
discussão necessária que devem ter os poderes federal, estadual e municipal. A
aparente saída de dois ministros da saúde por conta do imbróglio, em meio à
crise, tem atrasado processos de compra, ordenamento de despesas, diálogo com
Conass e Conasems, fortalecimento do SUS e planejamento concreto da economia do
país. É preciso igualmente que se avaliem os conflitos de interesse ligados a
essa recomendação quase que impositiva. Empresas que produzem HCQ têm tido alto
retorno financeiro, em tempos de carestia econômica para vários setores da
economia. Sem uma clara separação entre benefício real para a população e
benefícios exclusivos do setor produtivo do fármaco, o debate encontra forte
viés, que merece investigação por parte das autoridades”, reitera o documento
assinado pelos pesquisadores.

 

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